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CHINA: SEMPRE UM DESAFIO

Marcos Caramuru de Paiva
14/07/2014



Um xadrez complicado que poderá modificar a atual divisão de poder. Se persistir o antigo modo desequilibrado de participação tipo colonialista, pouca coisa vai mudar no manjar, só as moscas.

O atual governo chinês notabiliza-se por sua atuação em duas frentes: o combate à corrupção e a política externa. Em ambos os segmentos, a atual administração distancia-se consideravelmente da anterior e vai imprimindo um ritmo novo ao país.

Na área externa, os chineses seguem com problemas em seu entorno. Fizeram algum esforço para reduzir o grau de desconfiança dos vizinhos, na tentativa de entabular um diálogo com o Vietnã.

Mas a controvérsia territorial com o Japão não dá sinais de esmorecimento. E a aproximação norte-americana do Leste Asiático está crescentemente incomodando. O presidente Xi Jinping chegou a dizer recentemente que uma confrontação China-EUA seria um desastre.

Dentro e fora da Ásia, a China está operando uma ofensiva econômica de peso, valendo-se de seu estoque de capital, do desempenho de seu comércio exterior, da experiência acumulada por suas estatais e até do fato ter uma moeda de circulação limitada, o que tem levado os europeus a disputar a prerrogativa de firmar acordos para operar a conversão de renminbis.

Há um deficit extraordinário de infraestrutura em boa parte do mundo. Os bancos multilaterais de desenvolvimento há cerca de 20 anos reduziram o financiamento de novos empreendimentos, concentrando-se em projetos sociais.

É uma brecha que os chineses estão ocupando e onde vão operar com desenvoltura, sobretudo quando se criarem o banco dos Brics e o banco asiático, que já tem 22 membros potenciais.

As duas instituições terão uma estrutura decisória nova, em que nem os EUA nem os europeus terão voz. Serão o primeiro desafio aberto ao quadro de instituições multilaterais estabelecido no pós-guerra. A China terá nelas um papel preponderante, não em função da participação societária, mas sim porque será talvez o único membro que não precisará de recursos e que terá muito a oferecer em experiência e tecnologia.

Quem conversa com o setor público e com empresários chineses dá-se conta de que o entusiasmo pelo Brasil não é, nem de longe, o mesmo que marcou a primeira visita do presidente Lula em 2004.

O que se ouve mais frequentemente é que as peculiaridades da economia brasileira, sobretudo a estrutura tributária, dificultam novos investimentos; há dúvidas quanto a se efetivamente queremos empresas chinesas em infraestrutura no nosso cenário e o comércio não vai mudar de padrão.

Além disso, a tradição dos investidores externos na economia brasileira é explorar o nosso mercado interno.

Os chineses são diferentes. Quase sempre investem no exterior para exportar para a China. Seu foco é sempre o que acontece em casa. Estão longe de ter empresas com uma mentalidade verdadeiramente transnacional.

Abrir portas na relação com a China continua a ser, para nós, um exercício novo, cujas perspectivas futuras não estão claras. Mas não há como escapar. A China se impõe crescentemente no mundo. E quem não souber como se articular bem com ela estará longe do xadrez do século 21.



Diplomata, é sócio e gestor da KEMU Consultoria, com sede em Xangai, e vive há oito anos no Leste Asiático. Foi cônsul-geral do Brasil em Xangai, embaixador na Malásia, secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda e diretor-executivo do Banco Mundial, em Washington. Escreve a cada duas semanas.
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