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REEMBARCAR NA RODADA DOHA?

Luiz Carlos Bresser-Pereira
08/08/2013



Hoje, depois do colapso do liberalismo econômico e da ortodoxia neoclássica que lhe dava justificação "científica", essa crença não mais existe, e os países ricos, a começar pelos EUA, estão preocupados em proteger suas empresas e decididos a se reindustrializar.

Com a eleição de Roberto Azevêdo para diretor-geral, muitos pensaram que agora a Organização Mundial do Comércio poderá sair da paralisia em que se encontra e retomar as negociações da Rodada Doha, paralisadas há cinco anos.

Mas, não obstante a reconhecida competência do embaixador, é pouco provável que isso aconteça.

Desde a crise financeira global de 2008, não existe mais clima para liberalização comercial adicional. Uma maior abertura comercial, cujas vantagens para os países em desenvolvimento sempre foi duvidosa, hoje não interessa aos países ricos e também não interessa ao Brasil.

A OMC foi criada em 1995 no quadro da Rodada do Uruguai. Foi criada, portanto, em um momento de hegemonia ideológica neoliberal, com pleno apoio dos países ricos.

O pressuposto desses países era o de que só ganhariam com maior abertura comercial. Porém, quem realmente ganhou com a abertura foi a China, que combinou mão de obra barata com taxa de câmbio no equilíbrio correto, crescendo durante 30 anos a uma taxa média de 10,5%.

É verdade que os países ricos ganharam porque lograram o "espaço de política econômica" dos países em desenvolvimento ao proibir uma série da políticas de estímulo à industrialização que eles haviam utilizado no estágio correspondente de seu desenvolvimento.

Mas isso não compensou o custo que representou para eles a concorrência na produção de manufaturados originada não apenas da China, mas de vários países de renda média dotados da competência tecnológica necessária para isso.

A crença irracional no liberalismo econômico que existiu nos países ricos durante os 30 Anos Neoliberais do Capitalismo (1979-2008) os impedia de ver que a abertura comercial deve ser sempre realizada de maneira estratégica e cuidadosa.

Hoje, depois do colapso do liberalismo econômico e da ortodoxia neoclássica que lhe dava justificação "científica", essa crença não mais existe, e os países ricos, a começar pelos EUA, estão preocupados em proteger suas empresas e decididos a se reindustrializar. É pouco provável, portanto, que se interessem em retomar a Rodada Doha.

Quanto ao Brasil, nos anos 2000 o governo Lula estava convencido que valia a pena trocar uma redução da "tarifa consolidada" do país (a tarifa máxima que o país pode adotar), porque as tarifas efetivas eram bem menores, e porque o Brasil obtinha uma maior abertura para suas exportações de bens primários.

Agora, dada a enorme sobreapreciação cambial e a dificuldade que o governo tem em corrigir esse problema e fazer com que a taxa de câmbio flutue em torno do patamar de equilíbrio --aquele que viabiliza as empresas industriais brasileiras competentes--, não é o caso de reduzir os limites da tarifa consolidada.

Apenas perderemos mais espaço de política se o fizermos. As tarifas são um substituto parcial da taxa de câmbio. Sua elevação para compensar a sobreapreciação cambial não permite que o país exporte, mas evita que seu mercado interno seja entregue aos importadores.

Os industriais brasileiros e o governo deveriam, portanto, pensar duas vezes antes de reembarcar na Rodada Doha.


Fonte: Folha de São Paulo



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