Alfabetização sempre esteve presente no foco de Rotary. O RC de São Paulo em 1983, através do Ateneu Rotário, homenageou Hermógenes Moreira, tido como o patrono do MOBRAL. A palestrante Sandra Mutarelli Setubal veio nos falar sobre sua experiência na área. "Estudei no Rio Branco", foi como começou sua palestra e continua: "é muito bom estar aqui e falar sobre o termo Analfabetismo Funcional que surgiu pela primeira vez na 1ª Guerra Mundial". Naquele tempo, os soldados precisavam saber manejar sua arma e não conseguiam ler corretamente as instruções para tal, que originou o termo por se referir a funcionalidade de usar a língua de maneira a conseguir ler instruções e fazer alguma funcionar. Neste sentido, o Analfabeto Funcional é aquele que sabe ler instruções, mas não sabe fazer uso da língua, não consegue ler um texto simples e fazer disto algo para sua vida, como um simples recado.

Hoje em dia não se usa mais este termo, usa-se INAF - Indicador de Alfabetismo Funcional, que é usado desde 2002 no Brasil para descrever habilidades medidas por meio de uma escala que inclui leitura, escrita e cálculo matemático. No Nível 1, o indivíduo apenas decodifica as letras; no Nível 2, ele lê e escreve textos curtos, mas não consegue utilizar a leitura; no Nível 3, ele consegue ler um texto de média extensão e fazer inferências a partir dele; no Nível 4, ele faz algumas inferências do texto lido, resolve problemas de sequência simples e tem noção de proporcionalidade; e no Nível 5, o indivíduo tem capacidade de leitura plena.

Sobre o projeto com o qual trabalho, diz Sandra Mutarelli, é francês e se chama "La Main à la Pat", em português "Com a mão na massa". Foi desenvolvido pelo Prêmio Nobel de Física, Georges Charpak, falecido no ano passado (2012), com o objetivo de dar aulas de Física para a rede pública, porque a procura pela ciência pura estava muito pequena. Ao observar as crianças que faziam parte do projeto, ele percebeu que elas passaram a se alfabetizar com maior facilidade, o que levou a pesquisar a alfabetização por meio deste método. Conta Sandra Mutarelli que ela como membro da Estação Ciências, fez parte das equipes das Secretarias de Educações Estadual e Municipal, que foi conhecer o projeto na França, onde visitaram escolas e o centro de formação de professores.

A metodologia, que ela também aplica, parte de um problema inicial, como por exemplo, "de onde vem a água que usamos em casa?" A solução é dada pelos jovens e adultos, a partir do conhecimento que eles têm da vida. E, a discussão sobre a questão começa ali, com as soluções propostas por eles. Uma questão importante para se lembrar na alfabetização deste público, é que ele já passou por uma situação de derrota ao sair da escola, então, o método convencional é muito complicado para eles, bem como se forem tratados de maneira infantilizada, não conseguirão se abrir para participar e aprender. Um exemplo trabalhado com eles foi da água que usamos e que vem da represa Guarapiranga. Eles disseram que sabiam e inclusive viam pessoas jogando lá pneu, pedaço de carro, madeira, tinta, etc. Para que eles entendessem o processo de decantagem, nós os levamos a pensar de que de tudo o que jogam neste local, nada vem na água que eles recebem em casa. Então, os adultos inferiram que devia haver uma química para deixar a água boa, ao que nós perguntamos: "só a química resolve? ".

Ao promover a discussão coletiva com mediação entre o jovem e o adulto, que tem repertórios e vocabulários próprios, quando um aluno identifica seu nome no quadro ele se sente participante do processo, e isso é muito importante para a sua autoestima. Para terminar, a palestrante se colocou à disposição para colaborar com o Rotary e finalizou com a frase de Paulo Freire: "quando for ensinar um adulto se quiser falar à, você começou errado, porque sempre tem que começar a falar com".


Fonte: Rotary Club de São Paulo (pdf)