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TODOS OS GEKKOS DO PARTIDO REPUBLICANO

Paul Krugman
22/12/2011



Quase um quarto de século se passou desde o lançamento do filme “Wall Street”, que parece ser agora mais relevante do que nunca. Os artigos hipócritas dos magnatas financeiros criticando o presidente Barack Obama parecem todos serem variações do famoso discurso “a ganância é boa” de Gordon Gekko, enquanto que as reclamações contra o movimento Occupy Wall Street soam exatamente como aquilo que Gekko diz reservadamente: “Eu não crio nada. Eu possuo”, declara ele em determinado momento. Em outro trecho do filme, ele pergunta ao seu protegido: “Bom, você não é ingênuo a ponto de acreditar que nós vivemos em uma democracia, certo?”.

Mas, com o benefício da análise retrospectiva, nós podemos perceber que no final o filme perdeu um pouco o rumo. Ele termina com Gekko recebendo a sua punição, e a justiça sendo feita graças à diligência da Comissão de Títulos e Câmbio dos Estados Unidos. Na realidade, a indústria financeira simplesmente tornou-se cada vez mais poderosa, e os reguladores foram emasculados.

E, segundo o mercado de previsões Intrade, há uma probabilidade de 45% de que um Gordon Gekko da vida real seja o próximo candidato do Partido Republicano na eleição presidencial do ano que vem.

É claro que eu não sou a primeira pessoa a perceber a similaridade entre a carreira empresarial de Mitt Romney e as façanhas fictícias do anti-herói de Oliver Stone. De fato, o grupo Americanos Unidos por Mudanças, que é apoiado pelos sindicatos trabalhistas, está usando o termo “Romney-Gekko” como base para uma campanha de propaganda política. Mas há uma questão que vai além das críticas feitas a Romney.

Segundo o pensamento ortodoxo republicano, nós não devemos sequer criticar os ricos, e muito menos exigir que eles paguem impostos mais altos, porque eles são “criadores de empregos”. Mas a verdade é que vários dos magnatas atuais ficaram ricos destruindo, e não criando empregos. E o histórico empresarial de Romney ilustra muito bem esse fato.

O jornal “The Los Angeles Times” pesquisou recentemente a história da Bain Capital, a firma de equity privada que Romney administrou de 1984 a 1999. Conforme a matéria do jornal observa, Romney ganhou muito dinheiro durante aquele período, tanto para si quanto para os seus investidores. Mas ele fez isso de uma maneira que muitas vezes prejudicou os trabalhadores comuns.

A Bain especializou-se em aquisições alavancadas, adquirindo o controle de companhias com dinheiro emprestado. A garantia dos empréstimos eram os rendimentos e os bens dessa companhias. A ideia era aumentar os lucros das companhias adquiridas para depois revendê-las.

Mas como é que os lucros eram aumentados? A imagem popular – modelada em parte por Oliver Stone – é a de que essas aquisições são seguidas de severas reduções de gastos, principalmente em detrimento dos trabalhadores que perdem os empregos ou sofrem reduções de salários ou de benefícios. E embora a realidade seja mais complexa do que essa imagem – algumas companhias expandiram-se e contrataram mais funcionários após uma aquisição alavancada –, ela mostra uma grande parcela da realidade.

Uma análise recente das “transações com equities privadas” – o tipo de aquisição e controle no qual a Bain se especializou – observa que os negócios em geral estão sempre criando e destruindo empregos, e que isso se aplica a companhias que são alvos de operações de aquisição. No entanto, a criação de empregos nessas empresas não é maior do que em empresas similares que não foram escolhidas como alvos, mas nelas a “destruição de empregos é substancialmente maior”.

Portanto, Romney fez a sua fortuna em um setor que diz respeito, de forma geral, à destruição e não à criação de empregos. E como a destruição de empregos prejudica os trabalhadores mesmo quando aumenta os lucros e os salários dos altos executivos, as firmas de aquisição alavancada contribuíram para o misto de estagnação de salários e de disparada dos rendimentos nos altos escalões das empresas que têm caracterizado os Estados Unidos desde 1980.

Bem, eu acabei de dizer que a indústria de aquisições alavancadas como um todo tem sido uma destruidora de empregos, mas e quanto à Bain em particular? Segundo pelo menos um critério, durante os anos em que Romney esteve à frente da firma, a Bain parece ter sido especialmente impiedosa para com os trabalhadores, já que quatro das suas principais companhias alvos em termos de valor em dólares acabaram falindo (não obstante, a Bain ganhou dinheiro com três desse negócios). Isso é um índice de fracasso muito maior do que a média, até mesmo em se tratando de companhias que passaram por aquisições alavancadas. E, quando essas companhias faliram, muitos trabalhadores acabaram perdendo os empregos, as pensões ou ambos.

Sendo assim, o que se pode aprender com essa história? Não é que o empresário Mitt Romney seja um vilão. Ao contrário das alegações feitas pelos conservadores, os liberais não têm como objetivo demonizar ou punir os ricos. Mas eles fazem objeções às tentativas da direita de fazer o oposto, ou seja, de canonizar os ricos e isentá-los dos sacrifícios que se espera de todos devido às coisas maravilhosas que eles supostamente fariam por todos nós.

A verdade é que aquilo que é bom para a parcela formada por 1% dos indivíduos mais ricos, ou ainda melhor, pelos 0,1% mais ricos, não é necessariamente bom para o resto dos Estados Unidos – e a carreira de Romney ilustra isso perfeitamente. Não existe necessidade, nem motivo, para odiar Romney e outros como ele. No entanto, nós precisamos fazer com que pessoas desse tipo paguem mais impostos – e nós não podemos deixar que os mitos sobre os “criadores de empregos” desviem a nossa atenção.

Fonte: UOL Notícias



Paul Krugman – Prêmio Nobel de Economia
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