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A CAMINHO DO FRACASSO

Luiz Carlos Bresser-Pereira
01/09/2013



O liberalismo econômico rejeita déficit públicos, mas aceita déficit crônicos em conta corrente, o que o deixa sujeito a crise de balanço de pagamentos.

Liberalismo econômico e desenvolvimentismo são duas formas de organização econômica e social do capitalismo e dois estilos de política econômica. Nesta segunda acepção, a escolha do estilo envolveria uma troca: mais estabilidade no liberalismo, mais crescimento no desenvolvimentismo.

Na realidade, o liberalismo econômico rejeita déficit públicos, mas aceita déficit crônicos em conta corrente, o que o deixa sujeito a crise de balanço de pagamentos.

Já o desenvolvimentismo competente rejeita ambos os déficit, e promove crescimento com estabilidade, enquanto o desenvolvimentismo populista aceita os dois déficit, e acaba não logrando nem crescimento nem estabilidade.

As políticas econômicas liberais, ao aprovarem déficit em conta corrente crônicos, estão praticando populismo cambial: pensam que promovem o aumento do investimento, mas, ao levar o país como um todo a gastar mais do que suas receitas de exportação permitem, apreciam o câmbio, incentivam mais o consumo do que o investimento e, afinal, levam o país à crise.

O caso argentino mostra como um desenvolvimentismo que começou competente pode derivar para o populismo fiscal e cambial ("fiscal" se o Estado gastar irresponsavelmente, "cambial" se o país como um todo fizer o mesmo).

Depois de uma brutal crise causada pela adoção de políticas ortodoxas, o peso se desvalorizou. O novo governo que surgiu da crise estabeleceu uma retenção sobre as exportações de commodities que neutralizou a doença holandesa e produziu superávit em conta corrente; ao mesmo tempo, adotou política fiscal responsável, alcançou superávit fiscais e reestruturou sua dívida externa com coragem e firmeza.

O resultado foi o surgimento de oportunidades de investimento lucrativo para as empresas. A taxa de investimento aumentou, e o país cresceu a taxas elevadíssimas durante vários anos: em média, 8,5%.

Entretanto, em 2007, a inflação, que estava em torno de 9%, saltou para 18%, devido a um crescimento acelerado dos anos anteriores.

O governo, no quadro do pleno emprego, ao invés de adotar políticas duras e ajustar a economia, segurou o câmbio para controlar a inflação, e aumentou a despesa pública. Em consequência, o peso valorizou-se 41% entre 2007 e 2012, o país perdeu competitividade e entrou em déficit em conta corrente.

Devido a essa combinação de populismo cambial e fiscal, em 2012 o crescimento do PIB foi de apenas 1,9%, enquanto surgia novamente um mercado paralelo de dólar, hoje comprado pelo dobro do preço oficial, porque o medo de nova crise cambial ressurgiu na população.

Durante um tempo, vendo a responsabilidade fiscal, o superávit em conta corrente e a neutralização da doença holandesa, acreditei que os argentinos haviam aprendido a administrar o câmbio e a garantir a competitividade do país, e que poderiam ser um exemplo de novo desenvolvimentismo para o Brasil, que até hoje não aprendeu essa lição.

Mas, com tristeza, vejo agora uma estratégia de desenvolvimento que poderia ter garantido prosperidade e estabilidade para a Argentina caminhar para o fracasso.


Fonte: Folha de São Paulo



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